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Channel: Retina Desgastada
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(não) Jogando: Vampire The Masquerade - Bloodlines

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Vampire Bloodlines - Nosferatu

Criado contra minha vontade. Arregimentado para uma guerra que desconheço. Convidado para uma família que não me pertence. Arremessado para um mundo sem explicações. Essa é a origem de meu personagem em Vampire The Masquerade - Bloodlines e também a descrição perfeita para minha curta, mas frustrante passagem para o título consagrado da Troika Games.

Ironicamente, também é o último trabalho da desenvolvedora que passou pelas minhas mãos e foi rejeitado, a exemplo de Arcanum e Temple of The Elemental Evil. Tudo indica que eu e a finada desenvolvedora temos diferenças irreconciliáveis, mas fáceis de mapear.

Tirando os bugs, o grande problema de Arcanum era um sistema complexo e hermético, difícil de compreender e mais ainda de se entusiasmar, apesar do universo promissor. A trilha sonora é magnífica, vale dizer. Tirando os bugs, o grande problema de Temple of the Elemental Evil era um sistema complexo e hermético, difícil de compreender e mais ainda de se entusiasmar, apesar do universo promissor. A trilha sonora é razoável, vale dizer.

Acho que dá para entender aonde eu quero chegar com Vampire the Masquerade - Bloodlines.

A Troika Games aprendeu com seus erros do passado e, de fato, tornou os mecanismos que regem sua adaptação do World of Darkness algo mais fluido e menos na cara do jogador. Seja lá que regras esse universo obedece, elas não dificultam as ações. Entretanto, essa falta de transparência atrapalha na hora de se obter resultados. Não é mais necessário navegar por menus radiais ou decifrar a interface para executar um ataque, mas o sucesso ou o fiasco dele ainda depende de fatores alheios à minha compreensão.

Vampire Eyes

O fato de nunca ter jogado Vampire em uma mesa de RPG não deveria ser um obstáculo na experiência. Tampouco pisei em uma sessão de Dungeons & Dragons, mas isso não me impediu de apreciar e adicionar à minha Lista de Favoritos o eterno Baldur's Gate 2. A mesma premissa vale para Shadowrun Returns. No entanto, lá estava eu, não necessariamente lutando contra as regras de Vampire, mas lutando contra sua aplicação nos bastidores.

Por exemplo, temos a necessidade de consumir sangue alheio. Não se pode consumir um ser vivo até a última gota, sob o risco de perder Humanidade e descer aos porões do Frenesi. É uma questão então de se interromper o processo, antes da barra de sangue se esgotar. Na calada da noite, ataquei um policial que patrulhava sozinho um píer. Consumi somente o que precisava e deixei ele por ali. Ao retornar ao local, vi o policial novamente. Ou seria outro? Como funciona o respawn nesse jogo? Ataquei minha vítima novamente, para aprender da pior forma que aquele era o mesmo policial e ele só tinha um resquício de sangue no corpo. Consumi o que sobrava, perdi Humanidade por não compreender as mecânicas.

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Criado por uma vampira, sem a permissão da Camarilha, meu personagem aprende de forma traumática que criar vampiros não é bem-visto. Sua mentora é assassinada diante de seus olhos. Em outra situação, confrontado com uma mulher agonizante na cama de um hospital, eu podia transformá-la em Vampiro ou consumi-la. Ousado, resolvi desafiar as leis da minha sociedade sombria e a tornei uma de nós. Esse gesto foi recompensado com Humanidade! Inexplicável na minha visão do jogo, mas uma recuperação bem-vinda do ponto de Humanidade perdido anteriormente.

Confusa, minha "filha" pergunta o que aconteceu. Sabendo de antemão a dor e a perplexidade daqueles que são transformados e abandonados, resolvi abrir o jogo com ela. "Você é uma vampira agora". Já a imaginava ao meu lado, nós dois fugindo pelas ruas escuras, sobrevivendo. Ou pelo menos usá-la como bucha de canhão, já que é o que os vampiros fazem uns com os outros. Mas ela gritou loucamente e chamou a polícia.

Eu havia sido alertado que matar um inocente poderia provocar perda de Humanidade, mas matar para sobreviver em combate era aceitável. Com um policial atirando em mim por conta do pânico de minha recém-criada "filha", não hesitei em dar combate e matar o guarda. Perdi um ponto de Humanidade.

Mais perplexo do que nunca, fugi e fui perseguido pela polícia por longos minutos, mesmo escondido nos esgotos. Claramente há regras nesse mundo que não entendo. Se a proposta da Troika era simular o desconforto de ser um vampiro em um mundo de trevas e intriga, talvez eles tenham conseguido.

Logo no início, precisava invadir o covil de bandidos comuns, fortemente armados. Sabia que não poderia confrontá-los em combate direto com minhas habilidades Ventrue. Contornei a casa, encontrei o disjuntor e desliguei as luzes da casa. No escuro, imaginava que um vampiro teria mais chances, eventualmente abatê-los como os humanos frágeis que eram. Não esperava que dois deles me encontrassem do lado de fora, no escuro, e me enchessem de chumbo. Não foi uma vitória elegante, como nenhuma das lutas em que me envolvi em quase três horas de jogo. E a luz foi religada lá dentro. E não tinha mais como desligar novamente. Suspirei, encarei os bandidos que restavam, falhando em todas minhas tentativas de ser furtivo ou mortal, peguei o que precisava e fugi.

Vampire the Masquerade - Bloodlines nos apresenta um mundo aberto repleto de possibilidades, que podem ser diferentes para cada clã, para cada jogador. É um título supostamente flexível, capaz de conter cada estilo de jogabilidade. Por conta disso, não há dicas, instruções, apenas tentativa e erro. No meu caso, frustração, fantasias de poder mal-resolvidas e a ausência de motivações. Sem enxergar uma luz no final desse túnel, em desconexo com suas metas, despeço-me de vez da trajetória da Troika. Meu eu dos anos 90/00, obcecado por vampiros, se contorce no seu caixão e retorna para seu sono, talvez eterno.

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Ouvindo: Dead Can Dance - Radharc

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