Canadá. Periferia de Quebec. 1858. Onde homens usam barbas grossas, viram uísques para resistir ao frio tenebroso da noite e racham árvores com um único golpe de machado. Onde o limite entre o mundo racional e o sobrenatural é frágil e a fé, a força bruta e a astúcia são suas principais armas contra as criaturas da escuridão.
Esta é a atmosfera de Sang-Froid: Tales of Werewolves, uma mistura ímpar de planejamento estratégico e ação brutal que mergulha fundo no folclore canadense para construir uma história de irmandade, superstição e lobisomens. Desenvolvido por apenas 6 pessoas, boa parte delas oriunda dos estúdios da EA de Montreal, o jogo brilha em cada aspecto possível com um charme especial.
Na trama, o Diabo em pessoa tem planos sinistros para Joséphine, a irmã de dois lenhadores broncos do interior do Canadá. Dotada de poderes místicos, a jovem cai vítima de uma trama que a acusa de bruxaria e, junto com seu irmão mais forte, busca refúgio na cabana isolada de seu outro irmão. Há uma velha rixa entre os dois lenhadores, que é posta de lado diante da crise. Joséphine sucumbe a um transe espiritual, enquanto noite após noite, durante vinte dias, a cabana e outras construções ao redor serão assoladas pelo ataque incessante de toda sorte de monstro folclórico.
Graças aos dons proféticos da irmã, é possível saber antecipadamente quais e quantas feras irão surgir. Para sobreviver, o jogador gasta o dia e uma cota limitada de pontos de ação e dinheiro espalhando armadilhas pela floresta na rota que as criaturas irão seguir. É possível também comprar suprimentos e melhorar seu equipamento. Durante a noite, você irá descobrir o quão eficiente foi seu planejamento enquanto os inimigos sucumbem ou escapam ilesos. Desta vez, a ação acontece em tempo real e você terá que eliminar as bestas restantes, proteger suas construções, se preocupar com a munição, com a direção do vento, com sua fadiga e com os poderes e particularidades de cada fera.
Penúltima noite, falhando no minuto final
Na medida em que o jogo evolui, novos elementos vão sendo acrescentados à fórmula. Novas armadilhas, novas e mais poderosas criaturas, seres que são invulneráveis a este ou aquele método. Em outros momentos, você será obrigado a improvisar na noite gélida ou correr contra o tempo para cobrir a distância entre os pontos estratégicos. A complexidade escala, a curva de aprendizado fica íngreme, o desafio jamais cessa ao ponto de você se sentir seguro. E não poderia ser diferente: por mais badass que você seja com seu machado, seu casaco de flanela e seu rifle, você ainda é um humano. Lá fora, feras diabólicas querem seu sangue.
Apesar dos gráficos que evitam o realismo, Sang-Froid não te deixa esquecer que você está lidando com forças macabras. Mutilações, mortes e outros horrores se fazem presentes. Até mesmo um susto completamente inesperado que me fez gritar na sala, chamando a atenção da família toda. A trilha sonora, com fortes elementos folclóricos, evoca medos primitivos da aurora do tempo, quando o Homem não compreendia o que se escondia na escuridão. A arte foca na selvageria já na (demorada) tela de inicialização.
Em entrevista, os desenvolvedores, todos canadenses de raiz, revelaram que estavam cansados de criar jogos sobre culturas que não diziam nada para eles. Alguns haviam trabalhado em jogos dos Simpsons e na franquia Army of Two, para a EA Montreal. Juntos, montaram seu próprio estúdio e voltaram seu olhar para as tradições de seu país. O Canadá é um caldeirão cultural, com elementos oriundos da colonização francesa, com elementos oriundos do lado inglês, todos se mesclando com a já rica cultura nativa. Seus lobisomens não são aquelas bestas amaldiçoadas de Hollywood, mas espíritos corrompidos que saem de seus corpos e transformam lobos no escuro da floresta. Maikans são transmorfos da floresta, que nunca foram humanos. E ainda há o Windigo, a besta antropófaga temida por todos.
Para ajudá-los na empreitada, a pequena desenvolvedora chamou o escritor canadense Bryan Ferro, especialista em lendas da região. O Diretor Criativo Yan Pepin explicou o que eles tinham em mente: "Nós sempre pensamos que jogos poderiam ser utilizados como um produto cultural tanto quanto entretenimento. Nós achamos que ambos podem ser misturados - e que eles podem tornar um ao outro melhores. Nós quisemos fazer um jogo significativo. Nós quisemos criar algo que significasse algo para nós".
O resultado é um jogo envolvente, tenso, que mistura reflexos e planejamento em doses iguais, que nos traz uma cultura local jamais explorada nesta mídia mas que ao mesmo tempo fala sobre temas globais como o medo e como é possível superá-lo usando justamente aquilo que nos diferencia dos animais: a inteligência.
Dica: Sang-Froid: Tales of Werewolves está com 90% de desconto no Steam até o dia 18/01/2015, saindo por menos de três reais.
A Lista Avança
OutcastThe Walking DeadPaper SorcererNecrovisionZeno ClashGRIDDungeonlandRace the SunSang-Froid- Foreign Legion
- Hotline Miami
- STALKER Call of Pripyat
- The Bridge
- Brothers
- Papo & Yo
- The Witcher
Sang-Froid: Tales of Werewolves estava no meu radar depois de ler um artigo muito tempo atrás. Durante uma promoção no Steam, lamentei no Twitter que estava sem dinheiro para aproveitar a oferta. O camarada @arara_ teve a gentileza de me presentear o jogo na mesma hora. Muito obrigado, foi uma grande aventura. Que também serve para provar que a "maldição no blog"é uma bobagem...