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Turma do Funil

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A "estratégia do funil" foi algo que eu aprendi a duras penas nos primeiros dias do primeiro Diablo.

É bem possível que você faça parte da turma do funil mesmo sem perceber ou parar mais do que dois segundos para pensar no assunto. É um conceito simples, que vem dando certo desde 480 A.C., quando o Rei Leônidas segurou o exército Persa usando somente 300 soldados contra uma legião invasora. Esqueça o filme hiperbólico ou a graphic novel estilosa. A Batalha de Termópilas aconteceu e só foi possível porque os espartanos usaram a estratégia do funil.

De um lado, uma avalanche de inimigos, melhor equipados ou em maior número ou ambos. Do outro lado, você. Para sobreviver, você encontra uma passagem apertada onde só pode passar um ou dois oponentes de cada vez. Então, você vai dizimando, enquanto eles se espremem tentando te alcançar.

Louco é quem vai de peito aberto para o meio de um aposento em Diablo e encara todos os monstros que se encontram ali.

Jogos eletrônicos são um excelente lugar para exercitar seu conhecimento tático, sua malícia de jogador contra a ainda paupérrima Inteligência Artificial dos inimigos. Não desconfiam da armadilha, não desconfiam que estão sendo afunilados e vão caindo um a um, com uma perspicácia bovina. Você vira um corredor e espera, escopeta na mão, ou lança granadas pela esquina, ou conjura uma muralha de fogo ou planta uma torre. E eles vem. Para a morte.

A chave para controlar Age of Empiresé erguer muralhas em passagens de rios e protegê-las com torres e arqueiros. Sem saber usar barcos para cruzar rios, a pobre Inteligência Artificial sucumbe inerte enquanto minha civilização floresce.

age-of-empires

Desenvolvedores mais marotos, mas com poucos recursos, criam inimigos que não saem de seus pontos de ataque. Geralmente, são jogos onde é possível usar uma sniper... Dependendo da IA, você pode derrubar um a um sem que nenhum deles dê o alarme. Mas isso é assunto para outra postagem.

Os melhores desenvolvedores criam oponentes que afunilam você, sejam os fuzileiros e Combines da franquia Half-Life, que contornam sua posição e lançam granadas para tirar você da zona de conforto. Outra série que exerce isso com perfeição é S.T.A.L.K.E.R..

Já outros desenvolvedores entendem a estratégia do funil, abraçam-na com carinho, para depois destroçar o jogador.

Killing Floor e o Funil

O primeiro Killing Floor pode ter sido projetado ou não pensando no funil. Mas os jogadores descobriram.

Se você nunca jogou, é um título coooperativo onde ondas cada vez mais numerosas de monstros mutantes surgem para matar o time, até a chegada do chefe final. O segredo para a vitória é controlar um ponto de resistência, com poucas direções por onde as criaturas possam chegar, fechar portas para afunilar seu caminho, minar a passagem contra oponentes mais fortes. Enxague e repita até o final.

Dois pilares vitais para o funil são a capacidade de trancar portas com uma solda e a mina de proximidade. Com a primeira, é possível segurar quase indefinidamente um acesso. Se os monstros destruírem a porta, ela se regenera para a próxima onda. Com a segunda, um caminho pouco usado pode ser protegido para o caso de algum inimigo poderoso aparecer por ali ou mesmo para reforçar a direção que todos estão defendendo.

Killing Floor - Operação God Save the Queen 03

O funil: um único ponto de acesso. A retaguarda é protegida por um único soldado, raramente aparecem monstros.

Killing Floor - Operação Sabor de Fazenda 07

O funil: dois pontos de acesso, facilmente defensáveis da mesma esquina.

Com essa estratégia, nosso time venceu em 99% dos mapas do jogo, uma vez descoberto o melhor ponto de resistência.

Então, chegou Killing Floor 2...

De imediato, a Tripwire Interactive alterou o funcionamento das portas: a partir de agora, se uma porta for destruída, ela permanecerá destruída para o resto da partida. O time que quiser proteger uma porta vai precisar ser muito disciplinado e sortudo para mantê-la por todas as ondas.

Em seguida, a desenvolvedora alterou o funcionamento das minas de proximidade. Não existem mais minas de proximidade... Elas agora exigem um acionamento remoto, o que obriga o responsáel por elas a ficar atento para a chegada de inimigos e sua detonação, o que praticamente anula seu uso como uma proteção passiva.

O terceiro golpe fatal: a própria arquitetura dos níveis. Cada mapa possui mais pontos de surgimento de monstros que o Killing Floor original. Alguns destes pontos são dinâmicos e só são ativados nas ondas mais avançadas, destruindo o conceito de lugar seguro: bueiros antes inofensivos, janelas, telhados, buracos de ventilação, saem inimigos por toda parte.

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"Protejam o perímetro!""Que perímetro?!"

O resultado é um jogo mais tenso onde muitas vezes é necessário defender um perímetro de 360º ou simplesmente manter-se em movimento.

Mas aqui e ali eu começo a enxergar o funil se formando... mais de dois mil anos depois, ainda será possível triunfar com as lições de Termópilas. Se não nesse jogo, em tantos outros.

Isso é Esparta...

Ouvindo: The Cassandra Complex - One Millionth Happy Customer

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